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Evolução do acervo do STF em 2020

A disputa para ter destacado, no encerramento do ano judiciário, o nome do ministro mais produtivo teve o inegável benefício do fomento à celeridade na prestação jurisdicional. Contudo, também pode ter incentivado uma cultura de negação das causas pela aplicação de óbices processuais nem sempre adequados. A oportunidade de correção de eventuais equívocos também ingressou na corrida quantitativa, primeiro com a facilitação dos julgamentos por listas de processos afixadas em murais na entrada das salas das sessões; hoje, com a inserção deles nas sessões virtuais de julgamento. 

No final dos anos 1990, com a autorização para o relator negar seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou contrário à súmula do respectivo tribunal ou tribunal superior (art. 557 do CPC de 1973, com a redação dada pela Lei n. 9.139/1995), a secretaria do STF passou a registrar a produtividade mensal dos gabinetes, incentivando, com isso, a competitividade interna.

O volume de recursos e ações colocados em cada sessão virtual denota a impossibilidade fática na apreciação de todas as causas pelos próprios ministros. Tem-se, com isso, realçada a importância na organização interna dos gabinetes para prestar auxílio ao respectivo ministro na prestação jurisdicional exigida pela sociedade.

Pela análise dos números disponibilizados no site do STF na internet, o Pauta no Ponto buscará indicar, no início de cada mês, a atuação dos gabinetes no enfrentamento de seus acervos, além de apresentar um quadro comparativo da produtividade dos ministros, no intuito de auxiliar nossos visitantes a perceberem as estratégias do tribunal no enfrentamento da crise do judiciário.

Nesse contexto, o quadro abaixo (por ordem de antiguidade) apresenta um comparativo dos acervos dos gabinetes no último dia do ano judiciário de 2019 (19.12.2019) com o último dia do ano de 2020 (31.12.2020) para extrair o percentual de diminuição ou acúmulo de processos no período.

Presidência

Min. Dias Toffoli (jan-set/2020) / Min. Luiz Fux (set-dez/2020)
19.12.2019: 4.932
31.12.2020: 4.429

-10,20%

Min. Marco Aurélio

19.12.2019: 5.084
31.12.2020: 3.200

-37,10%

Min. Gilmar Mendes

19.12.2019: 1.991
31.12.2020: 1.607

-19,30%

Min. Ricardo Lewandowski

19.12.2019: 1.908
31.12.2020: 1.598

-16,20%

Min. Cármen Lúcia

19.12.2019: 1.497
31.12.2020: 1.080

-27,90%

Min. Luiz Fux / Min. Dias Toffoli

19.12.2019: 1.471
31.12.2020: 1.743

18,50%

Min. Rosa Weber

19.12.2019: 2.479
31.12.2020: 1.948

-21,40%

Min. Roberto Barroso

19.12.2019: 1.789
31.12.2020: 1.117

-37,60%

Min. Edson Fachin

19.12.2019: 3.249
31.12.2020: 3.113

-4,20%

Min. Alexandre de Moraes

19.12.2019: 854
31.12.2020: 838

-1,90%

Min. Celso de Mello / Min. Nunes Marques

19.12.2019: 2.813
31.12.2020: 2.025

-28%

A análise superficial dos números do quadro demonstra que os gabinetes dos Ministros Marco Aurélio e Roberto Barroso foram os mais produtivos no ano de 2020. Entretanto, deve-se considerar que, quanto mais lenha para queimar, maior será a fogueira. Assim, pode-se atribuir a elevada produção do gabinete do Ministro Marco Aurélio ao esforço para organizar e decidir um passivo acumulado por anos, no qual existem processos com diversas matérias já pacificadas pelo tribunal. O mesmo ocorreu no gabinete do Ministro Nunes Marques, recém ingresso na corte, sendo a elevada produtividade mérito do ministro aposentado Celso de Mello, que deixou o STF em outubro.

Também devido à sucessão de acervo, não se pode atribuir o acúmulo verificado no gabinete do Ministro Dias Toffoli apenas à sua equipe, porque herdado do Ministro Luiz Fux, que tomou posse na Presidência do STF em meados de setembro de 2020. A justificativa é verdadeira também quanto aos processos vinculados à Presidência, que tiveram uma expressiva diminuição, apesar do aumento de sua competência pelo alargamento dos filtros de distribuição (possibilidade de o Presidente evitar a autuação de processos com matéria já decidida).

Cabe destacar a atuação da Ministra Cármen Lúcia, que manteve a elevada produtividade de outros anos, baixando ainda mais um acervo já enxuto e se aproximando do Ministro Alexandre de Moraes, que parece ter atingido um piso no número de processos no gabinete, em sua maioria composto por causas em tramitação (instrução não concluída), significando que a baixa de acervo a partir daí dependerá da redução na distribuição de processos aos ministros, o que pode se dar tanto pelos filtros da Presidência quanto pelo menor ingresso de recursos na Corte, em razão da sistemática da repercussão geral.

No geral, apesar das dificuldades advindas com o surgimento da pandemia da COVID-19, o STF conseguiu diminuir quase um quinto (⅕) do seu acervo em apenas um ano! A notável proeza tem duas justificativas relevantes: uma, fundada na coincidência de os dois ministros mais antigos da Corte se esforçarem para baixar o acervo de seus gabinetes antes de suas aposentadorias; a outra razão está na medida implementada para garantir o funcionamento do tribunal durante o isolamento social imposto pela pandemia, consubstanciada na possibilidade de colocar-se qualquer classe processual na sessão virtual não-presencial, viabilizando, assim, o julgamento de causas instruídas, com dificuldade de inclusão na pauta presencial.

Resta saber se, apesar das críticas feitas por parte da comunidade jurídica, esse procedimento será mantido com o término da pandemia. Na nossa avaliação, os benefícios superaram os alegados prejuízos (dificuldade de sustentação oral, ausência de debates, etc.) e a alteração veio para ficar.